Liga da Justiça

4.0

NOTA DO AUTOR

Vou direto ao ponto, para não haver dúvida: Liga da Justiça é do caralho! Eu sei que existe uma espécie de regra tácita, segundo a qual a gente não pode dar confiança à Warner/DC ou ao diretor Zack Snyder desde o advento Batman vs Superman, mas já passou da hora de o público ter alguma maturidade e aprender a 1) julgar um filme apenas depois de vê-lo; e 2) dar o braço a torcer quando um cara que vem errando (sim, falo do Snyder) faz o trabalho direitinho. Não dói, nem custa dinheiro.

E aí, você pode me dizer que o filme presta por causa da intervenção do Joss Whedon, co-diretor não creditado, chamado às pressas para conduzir refilmagens e correções de roteiro, enquanto Snyder enfrentava uma tragédia pessoal (o impacto do suicídio da filha, Autumn, ocorrido em março, mas só divulgado em maio). Tudo bem, não tem como negar a influência positiva de Whedon. São dele as pontuações mais humanas vistas no filme, aquelas que pegam o espectador pelo coração. Contudo, mesmo as partes mais claramente “snydervision” demonstram evolução do diretor titular.

Liga da Justiça é redondinho, então? Não, não é. Tem um CGI vergonhoso em certos cenários e, em especial, no rosto do vilão Lobo da Estepe (com a voz gloriosamente gutural de Ciarán Hinds). Pela internet, existem críticas ao corpo do Cyborg, cujo design desagrada (para mim, não pareceu problema); e ao famoso bigode do Henry Cavill nas refilmagens, apagado com truque digital tão tosco que deforma um dos rostos mais bonitos de Hollywood – mas, pô, é UMA cena e nada mais!

O próprio Lobo da Estepe pode ser considerado uma escolha infeliz – afinal, todo mundo esperava ver Darkseid enfrentando a Liga, reproduzindo o que foi visto nos quadrinhos em 2011, no reboot Os Novos 52. Lobo da Estepe é aquele cara da música “Essa Mulher”, de Arnaldo Antunes: ninguém sente sua falta e, quando ele está em cena, ninguém sente sua presença. Apesar de todo o poder exibido e das ótimas cenas de pancadaria, nada muda o fato de que ele é um bucha. A Liga merecia mais.

Entretanto, se vamos falar de vilão ruim, duas palavrinhas para você, hater: Zemo. Kaecillius. Existem outras, mas paremos nestas. Portanto, xiu.

Amigo jagunço também reclamou de “motivo bobo” para reunir a Liga. Tudo bem, posso até admitir que a ameaça de fim do mundo em uma invasão extra-dimensional seja um motivo bobo, mas isso obrigaria todo mundo a repensar suas opiniões sobre o primeiro filme dos Vingadores. Desculpe se parece que estou alimentando cross. Eu gosto muito dos filmes da Marvel, mas achar que ela sempre acerta é tão bobo quanto crer que a DC nunca acertaria. Custou muito tempo e trabalho, mas, veja só, parece que Mulher-Maravilha não era um ponto tão fora da curva assim.

Liga da Justiça promove um novo olhar da própria DC sobre suas lendas. De certa forma, meio que desconsidera o fato de que o Superman (este, da era Snyder) se sentia um pária no planeta e destruía cidades tentando salvá-las. O herói “renasce” no novo filme – primeiro, metaforicamente, quando finalmente é visto pela população como o farol de esperança destinado a ser; depois, fisicamente, quando se junta aos demais heróis para combater o Lobo da Estepe (sua presença nos cartazes me exime de acusações de spoilers, certo?).

O evento que reúne a Liga da Justiça é a chegada do Lobo à Terra, em busca das três Caixas Maternas que estão no planeta. O nosso foi o único mundo em que ele foi derrotado, muito tempo atrás, por uma aliança entre humanos, amazonas, atlantes, deuses e alienígenas (prepare-se para umas boas surpresas nesta cena, infelizmente curta). Ao reuni-las, ele pretende retomar seu plano de transformar a Terra em um novo Apokolyps para Darkseid e voltar às boas-graças do temido novo deus. Uma das Caixas, como visto em BvS, está nos Laboratórios S.T.A.R.; uma segunda está em posse das amazonas e a última, na Atlântida.

Diante da óbvia constatação de que não poderão detê-los individualmente, Batman (Ben Affleck) e Mulher-Maravilha (Gal Gadot) começam a recrutar os demais heróis, visto nos arquivos de Lex Luthor: o velocista Barry Allen/Flash (Ezra Miller), o mestiço de humano e atlante Arthur Curry/Aquaman (Jason Momoa) e Victor Stone/Cyborg (Ray Fisher), um ex-atleta que deveria ter morrido em um acidente, mas foi revivido por seu pai, Silas (Joe Morton), cientista-chefe do S.T.A.R., com tecnologia da Caixa Materna.

Sobre os personagens, comecemos pelo mais polêmico: ninguém há de dizer que Ezra Miller é mau ator ou que não se encaixou no personagem; o problema do Flash no filme – isto é, além do uniforme horrível – é que ele não é Barry Allen, nem aqui nem na China. É um mix do Wally West e Bart Allen (respectivamente, segundo e terceiro Flashes) dos quadrinhos, constantemente com fome e fazendo piadas (umas boas, outras nem tanto).

Jason Momoa honra o Aquaman de Peter David, brigão, beberrão e meio cafajeste. São muito boas suas cenas de luta, principalmente aquela em que enfrenta o Lobo na Atlântida, com ajuda de Mera (Amber Heard).

O Cyborg de Ray Fisher é como o dos quadrinhos dos Novos Titãs, de Marv Wolfman e George Pérez: revoltadinho e meio boçal, mas de bom coração. Sua regênese pela Caixa Materna é muito importante para o primeiro grande evento pós-ressurreição do Superman.

Henry Cavill, aliás, volta como o Superman que todos queríamos ver no cinema e ainda não tínhamos conseguido: imponente, seguro, poderoso e muito, muito humano. Como não podia deixar de ser, volta-se a beber na fonte da clássica fase de morte e ressurreição nos quadrinhos, com resultados muito bons. Este Superman bate pesado!

Desde a primeira (e ótima) cena, quando detém um ladrão, Ben Affleck prova, mais uma vez, que é o melhor Batman do cinema: afasta-se da solenidade do Bruce Wayne da trilogia de Christopher Nolan e aproxima-se da abordagem pragmática e do bom humor ocasional da fase escrita por Joe Kelly (não deixe de ouvir nosso podcast sobre ela!).

Por fim, tem Gal Gadot como a Mulher-Maravilha. Se parecia que não dava para se derreter ainda mais por ela, aqui temos nova coleção de cenas memoráveis. Escolha a sua: ( ) o salvamento dos reféns em Londres? ( ) As lutas brutais com o Lobo? ( ) A briga com um colega de equipe? ( ) Todas as anteriores + as que não mencionei + o sorriso capaz de derreter manteiga?

Portanto, quer você tenha visto Liga da Justiça ou não, desarme-se. Se você já viu o filme, admita que ele é uma experiência deliciosa, apesar da desconfiança gerada pelos nomes e eventos envolvidos. Se ainda não viu, vá ao cinema de coração leve, porque você assistirá a um espetáculo de heroísmo, humor funcional e positividade. Quem diria que, um dia, usaríamos estas palavras pra falar de um filme que não é (sob qualquer aspecto!) da Marvel? Se Liga da Justiça realmente for a pá de cal sobre o trabalho do Zack Snyder com o DCEU, ele está saindo de cabeça erguida.


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