Os Vampiros

4.0

NOTA DO AUTOR

Certas passagens da História mundial nos são bem nebulosas. História da África e China antiga, para ficar nos mais óbvios, até hoje têm dificuldades de serem ensinadas nas escolas. É fato que nos concentramos mais na Inglaterra, França e Alemanha quando o assunto é Europa. Portugal sempre entra em nossa questão colonial – e mesmo assim, da perspectiva do Brasil. Antes de adentrar no século XX e na Primeira Guerra Mundial, estudamos o imperialismo (ou neocolonialismo). E lá, mais uma vez, Inglaterra, França e Alemanha dominam os livros, numa espécie de preparativo para a guerra.

Itália aparece como um apêndice (graças as suas proezas e fracassos), Espanha raramente é citada e Portugal segue no final do capítulo. “Manteve suas posses africanas conquistadas ainda nos séculos XV e XVI”. O que não deixa de ser verdade. Porém, não foi apenas isso. Os Vampiros, HQ portuguesa (banda desenhada, como eles dizem por lá) lançada recentemente pela SESI-SP Editora, mostra uma faceta dessa conquista que não estudamos por aqui.

Primeiro de tudo: esse é um gibi de guerra. É um grupo de soldados portugueses numa missão secreta na fronteira do Senegal com Guiné, este uma possessão portuguesa na costa atlântica. A missão é fictícia, o enredo que é histórico. Estamos em dezembro de 1972, final da guerra de libertação das nações africanas dominadas pelos portugueses desde muitos séculos. A guerra em Angola se encaminhava para o seu final. Revolucionários angolanos lutavam com as tropas coloniais de Marcello Caetano, então presidente de Portugal, sucessor de Salazar.

A missão do grupo é aparentemente simples: reconhecimento de uma base rebelde no Senegal. Encontrar a base, fazer o reconhecimento e retornar. Se você viu (e com certeza você viu algum) qualquer filme sobre a Guerra do Vietnã, esse gibi soará familiar. O grupo é bem heterogêneo e todos os personagens têm seu espaço. No entanto, alguns deles são melhor explorados e seus passados e razões para continuarem nesse inferno bélico são boa parte do terror. Mas não se engane: os vampiros estão lá, espreitando e esperando a noite cair.

Filipe Melo deve ser completamente desconhecido por aqui (pra mim, é). Grande autor, devo dizer. Diálogos competentes, uma história bem amarrada, cujo enredo te prende de uma forma que você só larga as duzentas e poucas páginas quando termina tudo. Sabe usar o fundo histórico a seu favor, sem se prender a ele. As poucas informações reais estão explicadas em curtas notas de rodapé (não se preocupe, são pouquíssimas). Mistura bem guerra com o suspense e terror. Se nada disso te convenceu, fique sabendo que Melo fez um extenso trabalho de pesquisa, utilizando relatos e baseando-se em histórias reais, enriquecendo sobremaneira sua história. Tudo isso aguça ainda mais a curiosidade do leitor, não tem como.

Na arte, o argentino Juan Cavia é competente. A princípio, achei que seu estilo não se encaixaria com a proposta da história. Rapidamente me enganei – e me surpreendi positivamente. Aproveitou o clima de suspense do enredo, criou alguns ângulos sensacionais e utilizou a escuridão da noite (e da selva) a seu favor, sem soar preguiçoso. Boa parte do suspense da história se deve ao seu trabalho.

Se você está procurando uma boa história de guerra, com seus dilemas e metralhadoras, entrelaçada com suspense e terror e cansou de vampiros adolescentes que andam na rua pelo dia, Os Vampiros é para você. É um terror bem Stephen King, nos quais as pessoas assustam mais que os monstros – posto que estes estão bem escondidos.

 

  

Roteiro: Filipe Melo

Arte: Juan Cavia

Editor: Bárbara Bulhosa (Tinta da China) e Rodrigo de Faria e Silva (SESI-SP)

Capa: Juan Cavia

Publicação original: junho de 2016

No Brasil: março de 2018

Nota dos editores:  4.0


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