Pense Num Gibi Ruim: Almanaque de Super-Heróis – Superman vs Shazam

4.3

NOTA DO AUTOR

Lembra-se daquele gibi em que o Super-Homem luta contra Muhammad Ali? Pois é, saiu nessa revista lá nos EUA. Um embate assim, grandioso e épico, só poderia ser parido por mentes tão inquietas de gênios como a do editor Julius Schwartz, do escritor Gerry Conway, do grande Rich Buckler e do onipresente Dick Giordano!

Ao contrário do visionário Zack Snyder, Conway e Buckler sabem fazer dois heróis saírem na porrada valendo, sem ter que apelar pro Ben Affleck ou a Gal Gadot (que daria uma ótima Mary Marvel, hein). Respeitam a identidade e as características dos personagens: você os reconhece e não dá a mínima se ele fazia sei lá o quê nos anos 1940. Em resumo, a revista entrega justamente o que está na capa. Mas por que esses dois grandes bobões estariam se estapeando em pleno o espaço? Cadê o escoteirismo do Super e a inocência do Fraldinha? Está justamente na capa: eles estão no espaço porque lá podem se matar à vontade, sem medo de serem felizes. Se fosse em Batman vs Superman eles brigariam no meio do calçadão de Metrópolis ou na porta do Banco de Gotham em dia de pagamento do estado.

As alfinetadas gratuitas e desnecessárias não terão fim. Pra entendermos as motivações (coisa rara em BvS), temos que voltar até… Marte! Sim, na terra do Ajax havia um cientista gente fina que ficou louco e virou feiticeiro! Sabe aqueles vilões clássicos? O cara mora num castelo no alto de um morro (Monte Olimpo) e faz feitiços com rimas! Melhor do que um Lex Luthor cheirador.

O mago lembra muito o Metamorfo, mas com brincos feito de olhos humanos (sim, ele não se parece porra nenhuma com o Ajax, pois é de uma civilização marciana muito anterior a do Caçador de Marte). Na verdade ele é todo verde (marciano, dããã) com a cabeça branca e raspada. Por isso também tem horas que ele se parece com o Luthor. Enfim, não se parece com o Merlin, é isso que quero dizer. O mago faz um troço num poço qualquer (óbvio) e faz aparecer o Adão Negro diretamente da Terra S e o – muita calma nessa hora – Quarrmer, da Terra 1. É o Super-Homem de Areia, que foi visto num desses Lendas do Homem de Aço. O Adão chega todo cheio de marra, leva um choquinho, fica cheio de dor e com medo. Quarrmer vê aquilo e nem discute. No entanto, ele não “convocou” os dois vilões pra trocarem sopapos com seus arqui-inimigos. Aqui tem motivação e roteiro! Não é Hollywood! O plano é o seguinte: cada qual vai colocar um dispositivo magnético em seu respectivo planeta (Terra S e Terra 1), pra que um atraia o outro e se escafeda numa bagaceira infeliz. Sim, só isso. Quer dizer, tem a pausa dramática:

“Um silêncio tumular cai sobre o castelo de Karmang, o Perverso, no rubro planeta Marte… Um silêncio de morte!”

Nem perca seu tempo questionando a ideia dele. Vamos logo pro capítulo um.

Uma manhã qualquer em Metrópolis

Por falar em vilão safado, aparece um em Metrópolis que nem é de lá, mas como as coisas estão ruim pra bandidagem em Gotham, Central City e Midway City, o cara achou que lá em seria mais fácil, pois talvez o Super-Homem estivesse ocupado! O coitado só dura duas páginas! Dá nem tempo da Miriam Lane fazer uma reportagem pra Rede Galáxia. Quer dizer, deu tempo, mas se Clark Kent aqui não torce pescoço de vilão, isso não significa que ele seja bonzinho. A fita gravada pela Miriam e seu companheiro simplesmente some e o escoteiro chega com uma gravação, no melhor estilo Peter Parker. Não sabemos onde diacho foi parar a fita original, mas a julgar pela cara de cínico do bom moço…

À noite, enquanto apresenta o Jornal Nacional, o prédio da TV começa a tremer. Super-Homem rapidinho tira todo mundo e vai lá averiguar. Sim, é o Capitão Marvel marretando o edifício e nem quer saber de diálogo: já dá uma remada na cara do Azulão. Como eles são amigos, o herói da Terra 1 quer dialogar, saber que porra é essa, sem machucar o companheiro. Pra isso, ele pede ajuda… Bom, a citação é melhor:

“Vou entrar em contato com a minha prima predileta, por meio de superventriloquismo! Juntos, acho que podemos dominar Marvel sem machucá-lo!”

Antes de você fechar essa aba, veja pelo menos o resultado:

Quarrmer perto disso é pinto, né? Óbvio que o Fraldinha em questão era o Adão Negro disfarçado. Ele tira (da roupa, que fique claro) uma pequena pedra com radiação de sol vermelho e mete na cara do Super-Homem, que fica puto da vida e sai cá boba serena atrás do Marvel. Ah, a Super-Moça chega lá só pra ver o primo virado e ir embora.

Enquanto isso, em Nova Iorque (e não em Fawcett City)…

Ou seja, não tivemos que esperar uma hora e meia de nada pra vermos o que o titulo propõe: um quebra entre os dois heróis, ainda que o Azulão estivesse na defensiva e fosse seus rivais disfarçados. O mesmo que aconteceu em Metrópolis se passa em Nova Iorque. E tome mais radiação de sol vermelho (o “Raio da Razão”) nos olhos pra deixar o Fraldinha maluco e se animar pro cacete que estar por vir.

O Super-Homem de Areia aproveita a deixa pra explicar ainda melhor o plano pra quem ainda não percebeu: fingindo ser os heróis, os vilões colocariam os dispositivos magnéticos em cada Terra e depois provocariam os heróis. Dessa forma, eles iriam brigar feito maloqueiros em show da Banda Calypso e nem iriam se ligar nos tais dispositivos. Mas não só isso: quando era cientista, o mago buscava a vida eterna e conseguiu, mas dizimou toda a população marciana! Agora os fantasmas vivem a assombrá-lo e só a energia gerada pela destruição de dois mundos vão libertá-los! Agora que as cartas estão na mesa, motivações foram dissecadas (e repetidas) à exaustão, heróis e vilões apresentados, vamos pro quebra pau definitivo.

Porrada

Metade do gibi já se passou, chegou a hora do quebra. Até porque daqui pra frente você já sabe, né? Briguinha, explicações, pazes, cacete no vilão, abraços. O que (talvez) você não esperava (esperasse) era o Conway deixar o Rich Buckler brilhar com páginas duplas, pin-ups e uns painéis fodaços, tudo isso no meio da história. Tem tempo ruim aqui, não. O cara sabia que nós estávamos esperando um cacete monumental entre esses dois heróis ultra fortes. Já vimos o plano, as motivações e todo lenga-lenga: faltava apenas o sopapos e a troca de tapa colossal. Então tome um deleite pro seus olhos. Madeira, viu? É uma senhora luta, ainda que seja ligeira e entremeada pelos coadjuvantes.

E a resolução, que fica por conta das mulheres da história: Mary Marvel e Super-Moça começam a conversar (graças a irmã do Fraldinha, porque a prima do Super-Homem queria sair na tapa) e, por método dedutivo, descobrem não apenas que há impostores, como quem são os impostores. Mas não só isso:

Verdade seja dita: uma luta homérica dessas iria destruir Nova York em dois tempos. Dois marmanjos desses derrubariam qualquer cidade. No entanto, sabe Rao como, apenas o terraço de um prédio veio abaixo, o suficiente pra dupla partir pras cataratas do Niágara, lugar mais aberto e com pouca gente descendo de barril nas quedas d’água. Enquanto os mimadinhos se estapeiam e ameaçam a hidroelétrica existente no local, Mary e Super-Moça rapidinho encontraram Quarrmer e Adão Negro. Não apenas rápido, mas de forma bem óbvia. A prima aspira (literalmente) o cetro do egípcio valentão e o transforma num coitado que é a cara do Norman Osborn. A irmã nem sua: Areia tá arrependido e conta todo o plano.

Bom, já está claro que são as mulheres quem vão resolver isso, né? Desse jeito, ambas partes em direção à Marte, só não me pergunte de qual universo, porque já perdi as contas faz é tempo. E por falar em tempo, a luta entre os dois marombados já tá demorando tanto, que o Super-Homem até se questiona o real motivo do embate! Isso no meio da luta! Só que, ao invés de apelar pras mães, aqui é o Mago Shazam que, FINALMENTE, resolve contar o que estava se passando. Só agora. Antes tarde do que mais tarde, os meninos finalmente destroem os aparelhos que estavam endoidando as duas Terras (já esqueceu, né?). O desfecho ficou então lá pra Marte. Verdadeira cientista, a Super-Moça descobre lá um dispositivo (o botão preto e não o vermelho) nos controles do mago e o manda pra um limbo qualquer. Por que ela e Mary também não foram? Porque ela carregou a irmã do Fraldinha de lá na velocidade da luz.

No final, tem uma cena de paquera descarada (Mary abraça o Clark e o deixa encurralado) e ciúme maluco que é melhor você nem ficar sabendo. Além de ser meio desnecessário. Impressionante como uma história maluca da Era de Prata ainda nos fascina hoje em dia. Precisamos de mais republicações como essa.

 

  

Roteiro: Gerry Conway

Arte: Rich Buckler e Dick Giordano

Editor: Julius Schwartz

Capa: Rich Buckler e Dick Giordano

Publicação original: All-New Collectors' Edition Vol 1 #C-58 (maio de 1978)

No Brasil: No Brasil: Almanaque de Super-Heróis (1980)

Nota dos editores:  4.3


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