O legado Mar-Vell (Parte 3)

Bem-vindos ao terceiro dia da nossa Maratona Mar-Vell, uma semana inteira dedicada a relembrar as origens do legado que começou nos quadrinhos e está prestes a explodir nos cinemas com o filme da Capitã Marvel. Já vimos, nos dois dias anteriores, que o primeiro Capitão Marvel (da Marvel, que fique claro) teve seus altos e baixos e altos, apenas para rumar novamente para o ostracismo.

As aventuras e a qualidade das histórias do Capitão Mar-Vell de Jim Starlin cristalizaram nesse breve período e não se repetiram mais. Mas os conceitos, ah, esses cresceram e não pararam. Só que isso é conversa pra outro dia, quando falarmos de outro herói escrito magistralmente pelo roteirista, o estranho Adam Warlock.

De toda forma, após a saída de Starlin da mensal do Capitão, tudo foi decaindo. Digno de nota, apenas um período poucos anos à frente, quando o herói conhece uma mulher que se tornaria seu grande amor e a responsável por perpetuar seu legado. Elysius, nativa de Titã, lua de Saturno e lar de uma facção dos Eternos, foi primeiro uma oponente, depois amiga e, por fim, companheira de Mar-Vell. Mas o personagem não estava destinado à felicidade e, no começo dos anos 1980, Starlin retornou para uma última história, trazendo aquilo que já havia apresentado da primeira vez… a morte.

E dessa vez, mesmo para os padrões dos quadrinhos, uma morte assustadora em vários níveis. Primeiro, por ser uma doença real. O personagem descobria ter câncer incurável e em estágio terminal. Segundo, por não ter solução mágica ou cientificamente avançada que o curasse miraculosamente, como seria de se esperar nos gibis. Terceiro, por mostrar um herói moribundo, não um guerreiro em uma batalha gloriosa. E quarto, por trazer a figura antropomórfica da morte para buscá-lo, além de estabelecer que esse falecimento seria definitivo. O cara morreu mesmo. Nunca mais voltou.

Foi o fim do conturbado personagem alienígena. Mas não do seu nome.

Carol Danvers, desde que ganhou poderes até esse período, tinha passado por sua cota de sobe-e-desce editorial.

Primeiro, ganhou revista própria como Miss Marvel. Era uma mulher forte e decidida, vinda do serviço militar, que se tornava editora-chefe de uma revista feminina de moda ligada ao Clarim Diário de J.J. Jameson, com quem batia testa constantemente. Mas ela nem imaginava que estava sofrendo de transtorno de dupla personalidade, com sua segunda persona sendo a heroína Miss Marvel. Complicado. Some-se a isso o uniforme. Fosse apresentado hoje, o traje com o decote invertido subindo da cintura para mostrar o umbigo, com a parte de baixo sendo um sumário shortinho ou biquíni, causaria protestos de objetificação sexual. Mas eram outros tempos, fica a discussão pra outro papo.

Ela enfrentou ameaças MONSTRO-DA-SEMANA, foi aliada dos Vingadores, perdeu a mensal e foi voltando a ser uma coadjuvante, até uma saga especialmente polêmica na mensal da superequipe, quando apareceu grávida sem ter tido relações com ninguém, passando por uma gestação acelerada e dando à luz um bebê que logo estava falando e amadurecendo também de forma anormal.

A explicação foi chocante.

Na dimensão atemporal do Limbo, Kang, o viajante cronológico, havia abandonado seu filho, chamado Marcus. O rapaz usou o maquinário do pai e acessou a dimensão terrestre. Ele abduziu, teve relações e engravidou Carol, devolvendo-a à Terra sem memórias disso. Tudo para poder escapar do Limbo, NASCENDO ATRAVÉS DO VENTRE DE CAROL. ELE FOI O PAI DE SI MESMO.

Essa trama labiríntica e essencialmente hedionda serviu para que ele pudesse existir na dimensão terrestre, mas ainda assim, tudo deu errado e o fluxo temporal foi afetado, criando caos até que ele aceitou retornar para o Limbo. LEVANDO. CAROL. CONSIGO.

Na história escrita por David Michelinie, os personagens tratam tudo como uma história de amor. Pouco tempo depois, o roteirista Chris Claremont interviria, mostrando o que realmente havia acontecido. Até certo ponto, Claremont fez do retorno de Carol um manifesto em defesa da personagem (do qual foi roteirista na sua mensal, quase uma década antes) e das mulheres vitimas de abuso sexual. Pois era isso que tinha acontecido. Em Avengers Annual #10, Carol retorna à Terra e é atacada por Vampira, integrante da Irmandade Mutantes, passa um tempo em um hospital e é acolhida posteriormente por Charles Xavier e seus X-Men. Ao se reencontrar com os Vingadores, desabafa em meio às lágrimas, revelando que Marcus usou de controle mental desde o começo, tanto para engravidá-la quanto para levá-la novamente para o Limbo.

Um gibi de super-heróis tratando de um tema virtualmente inédito no mainstream. Carol Danvers, vítima de abuso sexual, refletindo de forma surreal o que inúmeras mulheres passam, desde o princípio da humanidade.

Esse momento foi decisivo para a personagem em vários níveis. Claremont trouxe-a para perto de si e fez o que pode para mantê-la relevante. Ela perdeu os poderes devido ao ataque de Vampira. Passou a ser coadjuvante esporádica nas histórias dos X-Men. Acabou sendo abduzida por aliens da raça Ninhada. Foi submetida à experimentos e ganhou novos poderes, tornando-se uma forma de vida manipuladora de energia, com o codinome Binária. Agora, ela acessava energias diretamente de estrelas e podia circular sem equipamentos pelo vácuo sideral. Foi quando retornou a Terra brevemente e descobriu sobre a morte de Mar-Vell. Isso serviu como o empurrão que faltava para a personagem partir de seu mundo natal e se juntar aos Piratas Siderais em aventuras intergalácticas. Por algum tempo, ao menos.

Eventualmente, ela perderia seus poderes, voltaria à Terra, recuperaria parte do poder mas optaria por outro codinome (Warbird), voltaria aos Vingadores, seria revelada como alcoólatra, sairia do grupo, sumiria por uns tempos e nesse rolo todo já estamos chegando no século 21.

Um período de transição para Carol, que vamos abordar mais adiante. Em nosso próximo encontro, vamos ver o que aconteceu enquanto ela não mantinha o legado de Mar-Vell em evidência…


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