Bruce Timm é um nome que denota confiabilidade e respeito dentro da Warner Bros. Animation, mais especificamente no DC Universe Animated Original Movies, os ditos projetos de filmes diretamente em vídeo. Por outro lado, qualquer reputação, invencibilidade ou tabu pode ser quebrado no apertar de um “play”.
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Gotham 1889:
Como vejo o quadrinho Túnel do Tempo de Brian Augustyn & Mike Mignola? Como se “Batman Ano Um” fosse ambientado na Era Vitoriana, com atmosfera carregada, reencenações e adaptações pontuais do retrospecto do personagem. O enredo original começa com uma carta dirigida ao leitor assinada por Jack, o Estripador. É uma provocação velada, que resume para os leigos o mito que cerca às incógnitas históricas sobre o ilustre assassino em série de Whitechapel. 1889, portanto, seria o desconhecido “Ano Dois” do psicopata, um exercício de imaginação que a animação ignora.
Não apenas isso, o Gotham by Gaslight (2018) que acaba de ser lançado, ignora peculiaridades que abrilhantam as páginas do gibi, a exemplo do relato de Bruce Wayne ao Dr. Freud – que assim como Sherlock Holmes, foi um dos seus mentores – sobre o dia em que a carruagem dos pais fora interceptada por um homem armado, e os alvejou à queima-roupa, matando-os. O então menino só não teve o mesmo destino, pois morcegos assustados pelos disparos atrapalharam a mira do bandoleiro:
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Outro ponto dissonante reside na sequência do cárcere de Bruce; na animação, o tempo de prisão é mínimo e nada funcional para a trama; no quadrinho, o prisioneiro surta, mergulha fundo numa investigação na própria cela e, por fim, descobre quem é o criminoso – que por sinal também não é a mesma pessoa no filme.
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Além de pecar no quesito fidelidade, Bruce Timm anda pesando também a mão no apelo sexual que uma proposta mais adulta poderia propiciar aos seus vídeos, algo que o já fez errar grotescamente em Piada Mortal. Em Gotham 1889, ele dobra as apostas, usando o recurso na vedete Pamela Isley (abaixo); e não tarda muito e os longos da Srta. Kyle viram mínimos – outra liberdade poética, Selina nem existe no roteiro de Augustyn. Como bom macho, provavelmente, nem estaria fazendo comentários negativos se os gráficos fossem generosos ou sagazes com os olhos do espectador, mas no caso em questão é como se tu foste posar de provocativo com o design de Justice League Action…?!
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Falando nisso, é absurdo trabalhar em cima de material fonte ilustrado por Mike Mignola e não tentar mimetizar seu estilo marcante, como já se fez – com certo sucesso – em All-Star Superman, Cavaleiro das Trevas e Ano Um; ocasiões em que a produção tentou replicar a assinatura de Frank Quitely, Frank Miller e David Mazzucchelli. Num mundo perfeito, o Gotham 1889 ideal teria seguido exatamente a dinâmica de:
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Aproveitando o ensejo, prestigie o Cabeça de Parafuso e esqueça – leia-se, “perdoe” – mais essa bobagem do Bruce Timm. Afinal, como disse no comecinho, uma hora qualquer tabu vai pelos ares.
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Diário do Editor:
Como prometi nos últimos artigos, eis aqui e aqui as duas últimas pautas dos 7 Jagunços, respectivamente Mundo Gavião (#30) e Mágico Vento (#31). De autoria de Reginaldo, elas sempre são fruto de muita discussão e mudam bastante conforme vai chegando o dia da gravação ou, vá lá, até durante a própria. Eu acredito que um programa razoável só é tão bom quanto sua pauta, por isso, nós da família 7 Jagunços levamos a sério a redação da mesma e, não raro, o pontapé inicial do Senhor Yeoman é tão certeiro, que acaba ganhando a partida logo nos primeiros instantes.
Sou chato e bairrista, admito. Gosto do meu time e resisto à figura do “convidado profissional”. Minha linha guia é a do personagem no excerto acima. Se a biografia do forasteiro pode acrescentar algo, dou o braço a torcer e eu mesmo faço questão de desenrolar o tapete de boas-vindas, a exemplo do Edgar Smaniotto [Frontcast], que salvou nossas caras pálidas no podcast do Mágico Vento, agregando expertise histórica & fumetti à pauta. Por sorte, o próprio Reginaldo também era um ávido leitor do duo Ned Ellis/Poe Richards, e até anexou à pauta velhos textos publicados há uma vida de distância no seu saudoso BlogZine.
Ainda sobre nossas pautas, como dizia, desenhamos uma previsão do que deve entrar em cada bloco, mas quase sempre o programa foge ao nosso controle: o que deveria ser um bloco de 20 minutos vira 50 minutos, ou o que seria abordado no seguinte, antecipou-se no anterior e, como tudo pode piorar, um participante usurpou pontos que eram de outro participante. Tudo depende de uma confluência de fatores, se o tema era mais empolgante que o habitual, se a rédea do Host estava frouxa, se os participantes estavam desatentos/bêbados, se o convidado embolou o meio de campo, mas de uma coisa sei, uma pauta bem amarrada salva vidas.
No caso, a minha mesmo, já que como editor, tento ajustar o fluxo narrativo da coisa para que o ouvinte passe ao largo de toda as balbúrdias cometidas na trilha bruta. Isso mesmo, edição mais que um pé no saco, é um processo de lapidação no qual tudo o que é supérfluo deve ser extraído. E em se tratando das duas últimas pautas, afirmo com categoria, que Mundo Gavião foi uma de nossas pautas mais desafiadoras; afinal, fazer com que o complexo conteúdo sobre o personagem fizesse sentido tanto para nós mesmos quanto para o ouvinte, não foi lá um serviço dos mais fáceis – e nem sei se tivemos êxito.
Digo, foi divertido e tudo mais, mas os ânimos estavam nas alturas, sobretudo porque era nosso podcast de retorno, e acabou que aquela tal confluência de fatores confluiu com tudo. Para se ter ideia, de 2hs26min de bruto, cheguei à 1h29min – sem intro, trilhas e vírgulas. Com o arquivo pronto e acabado, ainda fiz ajustes na trilha incidental – que fica tocando no fundo – porque havia ficado um pouquinho alta e poderia atrapalhar a audição. No fim, me dei por satisfeito e, modéstia à parte, mesmo trabalhoso, tinha em mãos um ótimo conteúdo para publicar e isso era o que importava.
No próximo artigo, falarei um pouco do meu trabalho nas intros junto com esse maluco.
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