O Universo Compacto de John Byrne

“Minha vida é tão confusa quanto a América Central, por isso não me acuse de ser irracional.”

A poeira é algo que deve fazer parte de nossas vidas. Sua função é sedimentar as coisas, as camadas, permitir que surjam novas coisas dos restos dos destroços. A DC parece ter aprendido a lição. Em 2016 quando relançou seu universo com Universo DC: Renascimento, recém-lançado no Brasil, a editora deixou dicas enormes de que restauraria a Sociedade da Justiça e a Legião dos Super-Heróis (LSH). Passou o primeiro ano e ainda não avançou uma linha sequer no plot geral, preferindo sedimentar os personagens “renascidos”.

Este cuidado a editora não teve em 1987, quando reestruturou o Superman pelas mãos do escritor John Byrne. O escritor, disposto a aproximar o herói do conceito original, decidiu que ele não teria uma carreira brilhante como Superboy, passando a agir como Superman apenas quando adulto. Ok! Parecia um ponto acertado, já que alguns torciam o nariz para a versão adolescente do herói, claramente mais inteligente e poderosa que sua versão adulta. Superboy e suas séries, por sinal, são o mais extenso caso de retrocontinuidade da história dos quadrinhos, já que originalmente se passam antes da primeira aparição do Superman, em 1938.

A decisão de Byrne, da qual ele se lamenta publicamente, tirou a versão adolescente do herói da continuidade. Obviamente alguém leu com atenção o texto e lembrou-se que a Legião dos Super-Heróis, um grupo de heróis do século 30 havia se inspirado no Superboy! A própria equipe havia surgido como coadjuvante em uma aventura do personagem e posteriormente o título Superboy primeiro passou a chamar-se Superboy and the Legion of Super-Heroes, até alterar definitivamente para Legion of Super-Heroes. Era patente a importância do herói para a equipe!

Se fosse nos dias atuais, o correto seria dar tempo ao tempo. As coisas iriam se corrigir naturalmente. Mas é necessário dizer que nem todo mundo gostou da proposta de reformular o Universo DC, assim como muitos não gostaram do Superman de Byrne. Então, sob pressão foi pautado que o assunto da criação da Legião dos Super-Heróis teria que ser resolvido – e foi, de um jeito meia-boca!

Criou-se a ideia de que o Senhor do Tempo, o mais terrível inimigo da Legião dos Super-Heróis manipulou a equipe. Como? Ele capturou um momento do tempo na criação do Universo e criou uma realidade paralela chamada de “Universo Compacto” (“Pocket Universe”, no original). Neste Universo Compacto, houve uma Krypton, uma destruição, um sobrevivente e uma viagem para a Terra. O sobrevivente se tornou o Superboy, quando adolescente!

A manipulação, porém, continuou! Quando a LSH viajava para o passado, o vilão fazia com que a equipe fosse para o passado do Universo Compacto e não para o passado da Nova Terra surgida após Crise nas Infinitas Terras! A LSH também tinha os registros históricos desta realidade!

Na história contada em Legion of Super-Heroes #37, Superman #8, Action Comics #591 e Legion of Super-Heroes #38, depois que percebe que há inconsistências na história – vistas nas minisséries “Cosmic Boy” e Lendas – a LSH passa a crer que o Senhor do Tempo está agindo. Ao viajar ao passado, a equipe descobre uma trama onde o rapaz de aço se associou ao Senhor do Tempo para proteger seu Universo das energias do Antimonitor. Por isso, o garoto ataca a LSH e o Superman. Este último, no entanto, percebe que há algo mais!

Ao final, o Superboy se sacrifica, tencionando deixar sua dimensão livre do vilão!

Após a morte do Superboy, o conceito do Universo Compacto continuou ecoando para assombrar o herói. Em “The Supergirl Saga” publicada em Superman #21, Adventures of Superman #444 e Superman #22, o último sobrevivente de Krypton retorna ao Universo Compacto para encontrá-lo abandonado e semidestruído! Sem o Superboy para salvar a Terra, o Lex Luthor daquela dimensão liberta os três criminosos da Zona Fantasma. Eles lentamente destroem aquele mundo. Luthor constrói uma Supergirl de protomatéria para viajar entre as dimensões, alcançar o Superman e pedir socorro.

Byrne, abandonando o título, faz o herói tomar uma decisão difícil que o atormentaria por muitos anos. Além disso a única sobrevivente daquele universo, a Supergirl de protomatéria, vem para o nosso e primeiro passa um tempo na Terra para depois exilar-se no espaço e finalmente retornar, aliando-se no primeiro momento ao jovem Lex Luthor II – uma trama tão rocambolesca quanto esta.

Certamente você jamais ouviria falar novamente da Terra do Universo Compacto; mas as coisas são cíclicas. Em Legion of Super-Heroes volume 4 – a série que começou com o “Five Years Gap” – na edição #38 (dez/1992) a Terra do futuro é destruída. Parece ser algo definitivo, afinal uma das páginas mostra até a Morte dos Perpétuos aparecendo. Algumas cidades sobrevivem no espaço em bolhas, uma situação que deixa a população apreensiva. Então quase dois anos depois, em agosto e setembro de 1994, no arco “End of an Era”, R. J. Brande, o empresário que financia a LSH, decide sequestrar a Terra do Universo Compacto para o nosso universo (veja em Valor #22, o penúltimo número da revista do Mon-El). E ele consegue (em termos)!

O detalhe é que “End of an Era” foi a última história da Legião dos Super-Heróis. A DC Comics decidiu corajosamente reiniciar a equipe e desvinculá-la realmente do Superboy. “Zero Hora” provou-se uma oportunidade perfeita para tanto. Ironicamente, naquele momento já existia um novo Superboy na continuidade da DC Comics, o clone do Superman, surgido após os eventos de “A Morte do Superman”. Obviamente a DC e seus editores acreditaram que aquele Superboy não poderia inspirar a equipe de heróis do futuro.

Então, com o universo acabando, não fazia muito sentido, realmente, a Terra do Universo Compacto resolver a trama da destruição da Terra. Aparentemente as condições especiais desta Terra da outra dimensão não permitiram que o plano de R.J. Brande fosse à frente. Ao mesmo tempo, o universo estava acabando. Talvez a negativa fosse apenas um recurso narrativo de última hora para criar ainda mais confusão, mas o registrado é que a solução não funcionou como esperado.

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E, assim, o Universo foi reconstruído ao final de “Zero Hora” e o Universo Compacto passou a ser uma história ruim que só nos assombraria em lembranças.

 

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