X-Tudo Superior #6

Com a chegada da terceira edição de X-Men nas bancas do Brasil, além de vermos quatro capítulos das minissérie Dinastia X (3, 4, 5) e Potências de X (4), temos alguns dos mais cruciais e importantes momentos dessa nova fase, dos planos de Jonathan Hickman e, sem exagero, de toda a história dos X-Men nessas quase seis décadas dos mutantes. Então a coluna de hoje será toda sobre essa verdadeira revolução mutante, semana que vem teremos mais sobre o que saiu nos EUA e também um Arquivo da Mansão X. Bora lá que o papo é grande…

NO BRASIL

Em Dinastia X #3 temos uma ótima história dos X-Men que começa capenga. Por mais que alguém seja fã do Hickman, é preciso admitir que o sujeito muitas vezes é brega, cafona, canastrão e pretensioso. Aquele diálogo entre Scott Summers, Charles Xavier e Erik Lehnsherr, sobre a equipe estar pronta, a missão ter de ser cumprida, morrer e não ser esquecido… Ô, parece diálogo pomposo de peça teatral ruim. Ainda bem que foi somente nesse comecinho, depois ele tomou jeito. Ok, deixemos a reclamação de lado. Esse capítulo é maior que isso e é bom demais. Ironicamente é nos diálogos onde ele acerta, daí por diante.

A parte onde o Dentes de Sabre está sob custódia e Emma Frost chega humilhando os humanos é coisa fina, com a Rainha Branca sendo a Rainha Branca. Quem a conhece vai entender a aparente redundância nessa afirmação. Outra que está sendo escrita de forma magnífica é a Karima Shapandar, a Sentinela Omega. “Afinal, eles (sentinelas) sabem de onde vem os mutantes” é uma frase pra emoldurar, na mitologia mutante. E os oponentes, os humanos do grupo Orchis, são mostrados por um ângulo que QUASE nos faz entender suas motivações, mesmo discordando.

Esse é um dos grandes êxitos dos X-Men, alcançado ainda nos anos 1980 com uma singela edição de Uncanny X-Men, a de número 150, onde vimos pela primeira vez que Magneto, um dos mais caricatos vilões dos primórdios da Marvel, poderia ser menos unidimensional. Os melhores inimigos, oponentes ou vilões das histórias mutantes possuem ao menos um momento no qual se mostram mais complexos do que o tradicional “VOU ME VINGAR E DESTRUIR ESSES HERÓIS, HUAHUAHUA”. Já em Dinastia X #4, tudo começa com um senso de gravidade e de inovação que já deixa o leitor preparado para um desenvolvimento e um desfecho grandiosos. Mas mesmo assim não havia como estar preparado para o que acontece no decorrer desse capítulo. É realmente surpreendente.

Começando pela inovação, já que temos Xavier e vários X-Men agindo em, literalmente, comunhão. Um indicativo do que viria logo mais adiante. Com uma equipe X em missão no espaço, tentando invadir a estação orbital solar da Orchis, as chances de comunicação estavam zeradas, mas o Professor e seus alunos fazem um pequeno milagre coletivo. Unindo seus poderes, conseguem manter contato com Jean Grey, descobrindo que a situação por lá está indo de mal a pior. É tudo rápido, brutal e intenso.

Pra quem lê super-herÓis e suas variações há um certo tempo, histórias assim invariavelmente acabam sendo um sonho, uma realidade alternativa ou algo que pode ser mudado com uma viagenzinha no tempo. Ou algo que o valha. Por isso mesmo, essa história quebrou certas expectativas. A tragédia toda aconteceu mesmo aos personagens. E rendeu vários momentos de tensão muito bem executados, com uma página se destacando acima de todas as outras. O diálogo final de Kurt e Logan, antes de concluírem sua missão, é algo digno de figurar entre um top 10 das melhores sequências da história dos X-Men. E tudo termina em mortes e lágrimas para os sobreviventes. MAS…

Percebam que Mística fez algo suspeito antes de morrer. Considerem o que falou a unidade Molde-Mãe antes de cair no sol. Vejam o que Karima fez com Scott antes da Dra. Gregor matar o coitado. Algumas coisas não acabaram por aí. A história termina com Xavier determinado a não deixar que isso se repita. Está armado o palco para a próxima revolução mutante.

Com Potências de X #4, em preparação para resolver a tragédia ocorrida com Scott, Jean e os outros na estação Martelo do Sol da organização Orchis, vemos primeiro o desenrolar da OUTRA trama, que mostra as ações de Moira MacTaggert em sua décima vida afetando tudo o que sabíamos sobre os X-Men. Charles e Magneto são mostrados estabelecendo um acordo com o Senhor Sinistro, em um período meio nebuloso que pode conflitar com a cronologia X, mas, ei, a bagaceira já tá feita, vamos pra frente.

O que ficou estabelecido agora é que, pelo menos nos últimos 10 anos, Sinistro fez coleta de DNA mutante pra Xavier e Magneto, preparando caminho pra outra revolução mutante, além da criação da nação de Krakoa. O conceito é tão inaceitável pra quem lê e conhece os X-Men que deixa o mutuninha desarmado, gaguejando e sem reação pra contestar.

(Nesse meio, aparece um monte de “Fofocas do Sinistro”, tão cheias de potencial e subtramas que merecem uma palestra somente sobre isso, que fica pra semana que vem. Como estamos ambiciosos, hm?)

Mas voltando pra história, o tempo avança e chega ao período imediatamente anterior ao estabelecimento da aliança entre os mutantes e a ilha de Krakoa. E tome-lhe mais subtramas, referências e pano-pra-manga que rende pelo menos umas duas outras colunas.

Doug Ramsey, o Cifra, é levado por Charles Xavier pra estabelecer um diálogo com Krakoa. Parece simples, né? Pois talvez seja uma das sequências mais densas dessa saga toda. Primeiro, o Professor X está vestindo uma roupa e usando um chapéu IDÊNTICOS aos usados por sua, ahn, “irmã” Cassandra Nova, criada por Grant Morrison e Frank Quitely. O que nos faz pensar se a entidade psíquica também denominada como Mummudrai teria algo a ver com as ações do careca telepata nessa nova fase. Aliás, a cena toda emula também a primeira aparição de Cassandra, quando ela conduziu um dos descendentes de Bolivar Trask até uma unidade Molde-Mestre numa floresta, para usar o coitado como intermediário e dominar a máquina. É tudo obviamente MUITO semelhante. Hickman quis deixar o leitor cismado, apenas? Enfim…

Outro ponto de extrema importância: Doug está “vestindo” em um dos braços o mesmo tipo de pele tecno-orgânica que seu amigo de longa data, Warlock, possui. Warlock, da raça Tecnarca. Que tem o vírus transmodal. E que acaba sendo transmitido de Doug para a vegetação de Krakoa. Admita, é aquela mesma sensação de estar lendo as melhores fases e histórias X, quando Chris Claremont pegava um detalhezinho e jogava nas fuças do leitor, pra logo depois ir pra outra narrativa e te deixava aperreado, cogitando todas as possibilidades, esperando pela solução. Mas não satisfeito com isso, o roteirista resolve mexer com OUTRAS tramas. Antigas e novas. Temos uma origem pra Krakoa. Originalmente, era uma só terra chamada Okkara, que foi invadida por seres aparentemente místicos, demoníacos, usando uma espada que provavelmente é a mesma ou assemelhada à que Illyana Rasputin usa para comandar o limbo infernal que já pertenceu à Belasco.

Essa invasão ancestral teria dividido Okkara em duas, Arakko e Krakoa. Pra repelir os invasores, Apocalypse e seus Quatro Cavaleiros originais. Krakoa permaneceu na Terra, enquanto Arakko foi exilada em outra dimensão junto com os Quatro servindo de guardiões. Sério, isso sim é pegar uma mitologia, uma franquia, trazer uma ideia nova, costurar tudo o quanto for possível, tentando ao máximo preservar e inovar. Muitos elementos estão sendo alterados, é verdade, mas até aí, não seria algo de impacto sem mudanças extremas. O ponto é que, nessas duas minisséries, vemos uma celebração gigantesca de TUDO que faz parte dos X-Men, servindo para apresentar algo que já vimos, mas sob outras óticas, com novas narrativas e ritmos. Por exemplo: NOS X-MEN, NINGUÉM PERMANECE MORTO MUITO TEMPO. Essa frase, mesmo com outras palavras, é bem conhecida.

Charles Xavier já se fazia de morto nos tempos de Stan Lee, Jack Kyrby e Jim Steranko.

Jean Grey ganhou fama de imortal, desde o surgimento da Fênix.

Vamos resumir: quase todos os X-Men e seus inimigos já morreram e voltaram de alguma forma. Pois essa modinha mutante agora foi oficializada e instituída. É mais um exemplo perfeito do que Hickman está fazendo, gostemos ou não, concordemos ou não. Ele pegou um recurso manjado e feito de qualquer forma, ao longo das décadas e, ao invés de rejeitar, repensou e organizou. E aí chegamos à Dinastia X #5, onde o velho se torna novo, mutantes voltando dos mortos deixa de ser uma piada recorrente e as possibilidades narrativas explodem em caminhos quase infinitos.

Somos apresentados ao conceito dos Cinco. O roteirista pegou mutantes com poderes específicos para um trabalho coletivo: realizar milagre. Usando o banco de amostras de DNA recolhido e armazenado pelo Senhor Sinistro, Charles e Magneto podem, agora, ousar o impensável. Golden Ball, criado por Brian Bendis, praticamente um alívio cômico, com o poder de gerar e emitir bolas douradas, agora reinterpretado como um produtor de esferas com potencial de manter vida. Proteus, criado por Claremont e John Byrne, tem o poder de, literalmente, manipular e alterar a realidade. É filho de Moira MacTaggert, algo que tem MUITO peso nessa nova fase. Elixir, criado pela dupla Craig Kyle e Chris Yost, para uma das várias equipes de estudantes do Instituto Xavier, capaz de curar quase todo tipo de doença ou ferimento, agora usando seu poder para estimular a própria vida. Tempo, também criada por Bendis na mesma baciada de Golden Balls, com poder sobre… bem, o tempo. E Hope Summers, que já foi uma das mais importantes mutantes da história, mas cujos poderes variam muito de acordo com o roteirista. Agora o poder da moça está sendo usado para intensificar e harmonizar os poderes dos quatro outros que citamos, permitindo o tal milagre coletivo. Vida. Clones. Novos corpos para os mutantes mortos. Os X-Men possuem uma equipe que ressuscita mutantes.

Mas os Cinco, na verdade, são Seis.

É preciso que alguém conduza a essência e as memórias do finado ou finada para o novo corpo. E aí entra o professor Charles Xavier, usando seu poder mutante nível omega para, de certa forma, fazer um “download” de quem morreu para sua nova versão de carne e osso. O que também cria algumas questões… Mutantes não possuem almas? Almas são apenas memórias? O processo criado por Hank Pym, copiar padrões cerebrais e depois transferir para outra mente (biológica ou eletrônica), também seria uma ressurreição? De toda forma…

Finalmente vemos o desenrolar da cena que abriu toda essa saga, em Dinastia X #1. Pessoas saindo de casulos, Xavier se aproximando e dizendo sua frase clássica “A MIM, MEUS X-MEN”, sendo que os tais recém-nascidos dos casulos são Ciclope, Jean, Logan e os demais que morreram na estação da Orchis. E isso não tira, de forma alguma, o impacto da história onde morreram. Um conceito e uma execução quase perfeitas, não fossem certos questionamentos inevitáveis. Logan voltou com adamantium?!? Proteus literalmente pode fazer e desfazer a realidade, pra que precisaria dos outros quatro mutantes? E se um desses cinco for morto, como os quatro remanescentes poderão ressuscitá-lo?

Claro que tudo isso pode e deve gerar tramas e subtramas, o que é o mais lógico e esperado. Mais adiante, vemos um tipo de cerimônia na qual os habitantes de Krakoa recebem de volta os ressuscitados, onde tudo beira um evento religioso fanático. Ororo falando de forma incomum, os mutantes abaixo quase em transe, algo que pode significar um tipo de influência psíquica? Veremos.

Em outro momento, a geopolítica global é o foco, com os bastidores das articulações de poder. Xavier e Emma Frost demonstram que realmente são outros tempos, com novas e questionáveis atitudes. Então acontece algo que, embora já tenha sido feito na fase Utopia, quando os mutantes estabeleceram uma comunidade em uma ilha na baía de San Franciso, desta vez é ainda mais significativo. Nas palavras do Professor X, Krakoa é para todos os mutantes. E isso é sacramentado com a chegada de inúmeros mutantes tidos como “malignos”, o mais proeminente e inesperado deles, Apocalypse. Que afirma, plantando uma dúvida sobre os rumos dessa nova fase, que os X-Men e demais mutantes são agora o que ele sempre quis, estão onde ele sempre almejou. Sendo quem ele é, a dubiedade na afirmação é inevitável.

E o reencontro de Apocalypse com Krakoa recebe também o destaque que se esperaria, dado o vínculo que acabamos de descobrir. Essa edição da Panini consegue ser a mais bombástica, até o momento, em uma saga que tem sido explosiva desde seu início. A base e a estrutura estabelecidas nessas histórias poderia, por si só, render muito. No próximo número, teremos a conclusão e um novo começo. Veremos se essa renascença mutante sobreviverá à expectativa criada…


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