Inédita no Brasil, essa minissérie se passa um pouco depois de “Nightwing: Alfred’s Return”, que saiu aqui com o título original da história (“A Conspiração Inglesa”) em agosto de 1997 pela Abril Jovem (na saudosa revista Batman – Vigilantes de Gotham #10). Lá nos Estados Unidos, foi publicada em julho de 1995. “Nightwing: Alfred’s Return” foi escrita pelo grande Alan Grant e com arte do inesquecível Dick Giordano e conta basicamente a forma como Dick Grayson encontra Alfred galanteando por Londres. Logicamente, as coisas não são tão simples e a dupla se mete em uma grande conspiração de lordes, coisa e tal. Algumas informações sobre o passado do mordomo mais famoso do mundo são reveladas e, em seguida, desmentidas, justificando o seu retorno para Gotham City (se você não lembra, Alfred foi embora durante “A Queda do Morcego”).
Longe de ser um prelúdio pra vindoura revista do personagem, é apenas uma aventura solo do Asa Noturna tendo o Alfred como “parceiro”. Uma primeira experiência.
A DC Comics queria saber se o personagem engrenava sozinho. Sem Batman, sem os Titãs, sem nada. Não seria coadjuvante ou líder de uma equipe. Dick Grayson evoluíra bastante, passou por muita coisa, amadureceu, mudou de uniforme, assumiu o manto e o capuz do Morcego. Dirigiu um caminhão, plantou árvores, conheceu o mundo. Só faltava uma coisa: assumir seu próprio título mensal. Hesitante, a Editora das Lendas resolveu fazer um segundo teste com essa minissérie, que passou pros anais da editora como Nightwing vol. 1.
Tal empreitada precisava de um roteirista de peso. E ninguém melhor do que Denny O’Neil para a tarefa, não é mesmo? Ele conhecia o universo de Gotham melhor do que qualquer outro naquele momento. O’Neil explorou o passado de Dick, optando pelo assassinato de seus pais, John e Mary Grayson, mortos pelo chefe Zucco. (O roteirista Tim Seeley, atual escritor do título já no “Renascimento” da DC, resolveu inventar moda e explorar esse vespeiro dos Grayson Voadores, envolvendo aquele vilão surgido na “Corte das Corujas”.)
Supostamente, os Grayson foram assassinados a mando do primeiro ministro de um pequeno principado maluco que fica na Europa (ACHO), no melhor estilo Latvéria, quando o Circo Haly passou pelo local. Essa trama em si é um angu desgraçado. Dick vai bater em Kravia, o tal principado, pra investigar a morte dos pais e a trama se desdobra numa viagem louquíssima.
Essa, então, é a segunda subtrama (já falo da primeira): Heinmel Von Cart, o primeiro ministro, planejou um golpe de estado pra destituir o príncipe, que era todo mauzaum e cheio de cicatrizes no rosto. No lugar do príncipe, ele colocou seu filho, Kemper, à moda O homem da máscara de ferro. Pra ninguém estranhar (claro que seu filho tinha a mesma idade e porte físico do antigo déspota), ele manda fazer uma operação no rosto, o que deixa seu filho ainda mais mauzaum e despótico que o original.
E o que os Grayson tem com isso? Heinmel fez a “troca” dentro do circo, após o espetáculo (falei que o principado era minúsculo, não falei?), mas os pais do Dick ainda estavam por lá, dando uma olhada nas cordas. Você tá entendendo, né? É ainda melhor: ele deixou os Grayson irem embora pra tramar a morte deles em outro país, longe dali, dias depois do crime original. Mas que porra! Não se estresse: no final, sabemos que Heinmel não levou o plano à frente e quem matou a família foi o Zucco mesmo.
A primeira subtrama é o que move o início e o fim dessa minissérie. Lembre-se que estamos imediatamente após “Filho Pródigo”, o arco imediatamente após “A Queda do Morcego”, quando Bruce Wayne pôs o rabinho entre as pernas e imediatamente escolheu Dick pra substitui-lo. Agora o ex-Robin está simplesmente de saco cheio com essa porra toda, de ser sombra do Batman a vida inteira.
Sou jovem e quero viver! Ele até entrega seu antigo uniforme pro seu mentor e praticamente manda um “se fode aí” na cara dele. Só que antes, ele tinha salvo uma moça das garras de uns sequestradores e depois vai visitá-la no hospital. E advinha: ela se apaixona por ele (o cara é um galã, bicho). O resumo dessa primeira trama é que o pai dela, um ricaço que mora vizinho a mansão Wayne, é alcoólatra e bate na família. Sabe novela do Manoel Carlos? Ricos são cheio dos problemas e os pobres são alegres? Mais ou menos por aí.
Só que antes de salvar a moça, Dick precisa resolver seus próprios problemas. Com uma pequena ajuda da Oráculo, ele se manda pra Kravia pra descobrir aquilo que já disse pra você lá em cima. Muito disso aqui já está subentendido por você, né? País pequeno, militarizado, um déspota maluco, exército de um homem só, invasão. Tudo isso você já viu antes e aqui tá bem igual (exceto, talvez, por uma masmorra em que você é lambuzado com mel pra ser morto por uma horda de ratos famintos).
Basta, então, você saber que ele invade o país, é aprisionado junto com o ex-primeiro ministro (sim, se fodeu: o filho o mandou pras masmorras), descobre quase tudo, fica puto da vida com o cidadão, mas quer fazer prevalecer a justiça. Tudo isso sem ajuda do Batman, é claro.
Heinmel se arrepende (e morre no hospital), Dick fica aliviado e volta pra Gotham determinado a seguir sua carreira de herói. Lavou a alma, exorcizou seus demônios.
Viu que ainda tem lenha pra queimar e que ele sempre foi um herói e tudo mais. Até agradece seu antigo mentor. Enfim, abriu as portas pra sua série mensal vindoura. Era essa a função da revista e deve ter dado certo, já que a mensal dele começou no ano seguinte e durou nada menos que 153 edições, sendo interrompida em 2009 (e voltando em 2011, nos “Novos 52”).
O que você pode estranhar? A roupa antiga do Asa Noturna, que se não é pior (e não é) do que aquela original dele (com a gola enorme), é bem feia. Esses detalhes em amarelo parecem um sorriso do Coringa. Tanto é que logo na segunda edição eles já atualizam pro modelo que serve de base pro uniforme dele até hoje. Mas não é só isso, já diria aquele vendedor.
A série, graças a Deus, é um retrato fiel dos anos 1990: veja as roupas civis que Dick usa, o seu cabelo estilo Steven Seagal (nas capas não dá pra ver, mas ele amarra o cabelo bem fininho e fica parecendo que ele tem um rabo de escorpião) e as bagaceiras políticas de Kravia. Fora isso, só os problemas que o Greg Land tem de anatomia humana e a teimosia dele de mudar o rosto do Dick a cada página. Nunca é o mesmo personagem.
Vale dizer ainda que, logo que a série mensal estreia, Chuck Dixon (o roteirista da série por um bom tempo) já muda o local de atuação, quando Asa Noturna vai morar em Bludhaven. E o crime de lesa humanidade que foi deixar Scott McDaniel desenhando isso. Uma pena que o personagem nunca tenha tido lá muito espaço aqui, exceto pós-“Novos 52”, sobretudo com a elogiadíssima fase de Grayson. Leia tudo isso ouvindo Nightwing, do Black Sabbath.
Roteiro: Dennis O'Neil.
Arte: Greg Land e Mike Sellers.
Editor: Keri Kowalski e Pat Garrahy.
Capa: Brian Stelfreeze (#1-3) e Scott McDaniel (#4).
Publicação original: Nightwing vol. 1 (setembro a dezembro de 1995).
No Brasil: Inédito
Nota dos editores: 1.8