Brett Booth renasce!

Se você já era leitor de quadrinhos em 1992, são grandes as chances de ter lido a saudosa revista norte-americana Wizard (a original, não a versão nacional que teríamos anos depois), que nos serviu durante um bom tempo como canal impresso de informação sobre os gibis produzidos nos EUA, afinal, internet ainda era uma lenda urbana para a maioria da população. E foi através dela que pudemos conhecer editoras e universos e personagens que se mantiveram inéditos no Brasil, alguns deles até hoje, inclusive.

Três nomes que ganharam destaque na Wizard, nesse começo dos anos 90, ressurgiram recentemente com um surpreendente (bom) nível de qualidade: Valiant, Bloodshot e Brett Booth.

Bem, pra falar a verdade, a editora Valiant some e volta de tempos em tempos, sempre contando com a nostalgia dos fãs e com boas fases que conquistam novos leitores, apenas para se recolher novamente e dar continuidade a um dos ciclos mais admiráveis de ressurgimento dessa nossa querida indústria vital. Essa editora foi fundada pelo lendário roteirista e editor Jim Shooter, cuja biografia nos quadrinhos por si só já rende artigos e mais artigos, mas vamos falar somente dessa empreitada do sujeito. Entre 1988 e 1991, Shooter (que havia sido demitido da Marvel em 1987) liderou um processo que resultaria em um novo universo de heróis com alguns velhos personagens no meio. Calma, isso também rende um longo artigo e não vamos desperdiçar essa chance aqui. Basta dizer que em tempos de quebra do domínio Marvel/DC nos quadrinhos com a chegada da Image Comics, a Valiant também teve um certo destaque com personagens como Rai, Solar, Turok, Shadow Man, Magnus, Ninjak e Eternal Warrior. Foi na mensal desse último que surgiu o segundo nome a ressurgir por esses dias, o soldado imbatível conhecido como Bloodshot.

Criado pelo roteirista Kevin VanHook, pelo artista Don Perlin e pelo veterano faz-tudo Bob Layton, Bloodshot era um produto tardio dos anos 80, refletindo também alguns dos mais explorados conceitos da Image. Um supersoldado carregando metrancas e facas, com algum tipo de “fator de cura”, sendo alvejado e despedaçado apenas para se recuperar e partir para outra sessão de mutilações, tudo isso enquanto fazia o mesmo com seus inimigos. Sua particularidade estava na origem de seu poder, os nanitas que lhe permitiam não apenas se recuperar de ferimentos, como alterar sua aparência, além de lhe darem força e capacidades sobre-humanas. Inclusive, seu codinome veio da carga de nanitas recebida, que foram injetados em sua corrente sanguínea.

O terceiro nome a surpreender recentemente é de um artista que ganhou fama efêmera na já citada Image Comics, mais ou menos quando Bloodshot e a Valiant estavam conquistando seu espaço na memória afetiva dos leitores. Brett Booth começou tentando imitar o padrão Jim Lee, mas tinha algo meio esquisito em seu traço, a anatomia não era tão “bonita” quanto nos trabalhos de Lee. Ele tentava aplicar também o estilo de Todd McFarlane, o que deixava tudo ainda mais estranho; mas o importante é que isso era tendência na época e o cara virou favorito dos leitores que babavam o estilo Image.

Booth nunca evoluiu desde então, acabou fazendo trabalhos cada vez mais fracos… Ora, vamos deixar de cerimônias, o cara fez gibis medonhos nesses quase 30 anos em que permanece na indústria. Eis que… 2019 definitivamente tem sido um ano bizarro. Agora em setembro tivemos mais um relançamento de Bloodshot, com a Valiant se preparando para o lançamento do filme do personagem em 2020, interpretado pelo Vin Diesel. O roteiro do gibi é do mediano Tim Seeley e a arte é de Brett Booth. E você quer saber o motivo dessa enrolada toda, esse monte de informação inútil que foi postada aqui até agora?

UM GIBI DA VALIANT COM BLOODSHOT FEZ O MILAGRE DE MOSTRAR O MELHOR TRABALHO DE BRETT BOOTH EM TODA SUA VIDA!

Sério, dê uma chance. O gibi já tem duas edições lançadas, a história é bem simples e clichê, porém muito bem contada, mas a arte (e a colorização) valem a leitura. Tem aquela estilização bonita by Jim Lee que conquistou o mundo, mas tem um ritmo e um esmero narrativo perfeito pra uma aventura dessas, onde um supersoldado enfrenta exércitos, alta tecnologia e tem explosão e correria a cada duas páginas.

Divertido e enxuto como convém, mas fazendo a proeza de mostrar, talvez pela primeira vez, um bom trabalho de um artista que parecia não ter mais jeito. Portanto, fica aqui um daqueles momentos que todo leitor de quadrinhos preza. Quando precisa dar o braço a torcer e admitir que um artista ruim pode fazer algo bom. Quem ganha, obviamente, são todos os envolvidos. A editora, o personagem, o desenhista. E o leitor, claro.


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