Crise no mercado editorial: as comic shops

Seguimos com a crise no mercado editorial do Brasil. No último post, falamos como a quebra do Grupo Abril afeta o mercado de bancas de revistas. Agora, o assunto é a situação das lojas especializadas, as chamadas comic shops.

Algumas das lojas mais tradicionais de grandes mercados, como Rio de Janeiro e São Paulo, fecharam recentemente devido à crise que assola o nosso país.

O mercado alagoano poucas vezes contou com lojas especializadas em quadrinhos ou mesmo em produtos nerds/geeks, e quando teve, a iniciativa durou bem pouco, mesmo na era pré-internet. Um dos fatores que dificultava a vida de quem queria empreender nesse segmento era justamente a distribuição. A Comix era a única distribuidora para o segmento de comic shops e as exigências de compras era absurda pro pequeno mercado alagoano, então tínhamos que nos contentar com algumas bancas que recebia todo o material distribuído e ter que aturar a famigerada distribuição setorizada.

Hoje, temos apenas uma loja especializada em quadrinhos na capital alagoana. A Leiarte Comics fica localizada no centro da cidade e surgiu como uma banca de revistas, primeiro num shopping, depois migrando para uma banca no calçadão do comércio do centro da cidade e finalmente se estabelecendo numa pequena loja. Mas como sobreviver nesse cenário de incertezas e de competição com as megastores?

Conversamos com João Paulo, proprietário da Leiarte.

Arte-Final: Com o pedido de recuperação judicial da Abril, você já está vendo alguma mudança na distribuição das revistas pela Total/Dinap?

João Paulo: Sim, sim. Na verdade já era sentido que algo de errado estava acontecendo. Apesar de não trabalhar com os produtos gerais de banca, já era notado, pelo contato que tenho com jornaleiros, a diminuição das publicações em bancas, ficando às vezes a semana inteira sem novidades, sendo que o recebimento de material sempre foi diário e em grande diversidade.

AF: Você já teve uma banca de revistas tradicional e migrou para uma comic shop. As bancas hoje são mais parecidas com uma loja de conveniência do que com uma banca tradicional. Você vê essa como uma alternativa à diminuição da venda de periódicos impressos?

JP: Em sua maioria, sim. Ainda tem algumas poucas que conseguem sobreviver apenas com impresso, mas a tendência é essa mesmo, os donos vão ter que se adaptar e ser criativos se quiserem manter seus pontos ativos. Publicação de impressos, que já foi um negócio base para a sociedade, a única fonte de conhecimento, hoje com os novos recursos, já é algo obsoleto e passou a ser um negócio de “nicho” direcionado a públicos-alvos específicos e restritos. Logo entra na questão da “oferta e procura” e apenas os mais qualificados e que entendem isso devem conseguir se manter.

AF: Como é para você ter que “competir” com players como Amazon/Saraiva e qual a sua estratégia para isso?

JP: Não há competição. As megastores estão no patamar e realidade muito acima e são desleais em certos quesitos, prejudicando o mercado para agradar os público. É ruim? É, mas funciona! Melhor aceitar e trabalhar com possibilidades dentro da realidade. Quem compra com elas, não vai parar de perder os descontos e oportunidades só para manter uma comic shop aberta. Pode até manter uma ou outra coleção conosco para ajudar ou, de repente, algo que as megastores não recebam, mas é isso. Nossa alternativa tem sido trabalhar a comic shop como um espaço de convivência, além de atender o público nerd/geek não só com quadrinhos, mostrar o quão pode ser positivo ter um espaço como o nosso na cidade e esperar o reconhecimento natural e a partir daí ter preferência sobre os pontos de venda com o qual podemos competir, que são as bancas, sites menores e assinaturas.

AF: O que vende mais em sua loja hoje em dia: comics, mangás, Turma da Mônica ou cardgames?

JP: Há um equilíbrio. No começo eu tinha mais sucesso com os comics, hoje tá bem balanceado, com exceção do público infantil. É a parte da população que ainda não conseguimos atingir e estamos trabalhando alternativas para isso.

AF: Você trabalha também com gibis independentes. A procura é grande por esse tipo de material autoral?

JP: Trabalho, sim, mas a procura é bem pequena, é um nicho do nicho, entende? É importante ter e é preciso valorizar o que está sendo feito por aqui e pretendo expandir ainda mais, pois é uma alternativa que precisa ser explorada. Acredito que o mercado local se valorizando pode trazer um apelo muito positivo, que é a possibilidade de estar perto, poder conversar com seu ídolo. É muito bacana ter algo de quem você gosta e admira e mais ainda é poder ter acesso a essa pessoa. Isso é algo que pode ser um diferencial da loja, vamos trabalhar mais e mais com isso.

Conversando com alguns colecionadores, são poucos os que, com acesso à internet e consequentemente às megastores, ainda pagam o preço cheio de um encadernado ou edição em capa dura, justamente em razão à politica de descontos promovida por essas lojas, e um pequeno empreendimento na capital do segundo menor estado da federação não tem a mínima condição de competir com isso. A alternativa, como bem falou o João Paulo, é fidelizar o cliente oferecendo outros serviços e promovendo eventos no ambiente da loja e dando um toque pessoal nesse atendimento, coisa que nunca iremos encontrar num ambiente virtual.

A solução para isso está longe de ser encontrada e a luz no fim do túnel ainda não apareceu.


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