Novamente num beco escuro de Gotham

Do nada e sei lá porquê, Chip Zdarsky resolveu contra outra origem do Batman. Dessa vez em dez partes, por que não? E por pelo Black Label, o selo oficial do Batman adultão da DC. Parece inevitável para qualquer escritor de quadrinhos que pise na DC Comics: imediatamente eles são tomados por uma vontade absurda de visitar um beco escuro de Gotham e contar a origem do Morcego, seja para mostrar novos diálogos irrelevantes, seja para acrescentar detalhes retconenados que vão servir para sua história, estilo Tom King.

Numa das últimas vezes, trouxeram Thomas Wayne de volta. Ou seja, acabou com a origem. Verdade seja dita: o tie-in escrito por Brian Azzarello na época do Flashpont pré-Novos 52 (que bagunça!) foi a melhor coisa daquele momento. Mas, claro: por que deixar aquela ótima história largada em lá dez anos no passado se podemos trazê-la para continuidade? Mais bagunça.

Para mim, não faz sentido: se tem Thomas Wayne vivo (mesmo que seja um sociopata superforte e incoerente), não tem Batman. Esse monte de origens, agora quase bienais, estão aí para isso. Simples.

OK, DC, vamos lá com mais uma origem. Perdi meu tempo e dei o benefício da dúvida, sobretudo por gostar muito do Zdarsky. O Homem-Aranha dele é maravilhoso. A essa altura do campeonato, o próprio está mais do que estabelecido como roteirista, tem ótimas passagens por aí afora na Marvel (o outro Aranha dele também é maravilhoso) e excelentes séries autorais em outras editoras. Pegar logo o Batman e logo a origem parece um grande influxo criativo.

Tudo bem, personagem mais rentável da editora, onipresente, com muitos fãs e que sempre gera repercussão. Deve ser o sonho de muito escritor por a mão no Morcego. Um queridinho aqui da casa fez isso recentemente e meteu os pés pelas mãos: Batman: The Detective do Tom Taylor não é apenas ruim, é completamente esquecível e desnecessário. Uma das piores coisas que li em 2021.

Certo, o que temos de novo no velho?

Spoiler: quase nada. De cara, um jovem Bruce Wayne fazendo uma sessão de terapia Hugo Strange, um dos vilões mais frequentes nas últimas décadas. Esse primeiro capítulo é um vai e vem entre Bruce criança pós-assassinato rebelde na escola e o jovem Bruce na faculdade, em lutas clandestinas e na terapia. A presença do Alfred dá um peso dramático esperado, meio que um “para vocês que estavam com saudade”.

Em resumo – e lembre-se que é a primeira edição de dez -, temos a origem de sempre (é claro, ao menos por enquanto) ultradiluída com um viés psicológico mais forte, estilo Tom King lá no arco “Eu Sou Suícida”. Nada de novo, nada necessário, deixando ainda mais gritante o quanto essa indústria anda ruim de ideias e vem sufocando os autores com as mesmas bobagens mercadológicas de sempre. Uma história ruim? Longe disso, Zdarsky escreve muito bem, seus diálogos são ótimos. A arte mesmo é linda. Mas a arte do David Mazzucchelli segue linda e atual em Batman: Ano Um, que você acha fácil por aí em inúmeros formatos e em quatro edições. Entende?

Ganhamos mais lendo outras coisas –  e tem muita coisa boa saindo feito por esses mesmos autores.


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