Muito lentamente as obras do espanhol Paco Roca são publicadas no Brasil. Faz uns anos que a mesma Devir lançou Rugas com relativo sucesso, sendo bastante elogiado e comentada internet afora. Depois disso, voltamos ao ostracismo. Agora, como quem não quer nada, a editora paulista retorna com o belíssimo A Casa, que tem um formato meio horizontal (Rugas segue o vertical pouco maior que o formato americano). Eu mesmo indiquei outro gibi dele, El Faro, mais curtinho, mas igualmente poderoso.
A arte de Roca é muito boa, belíssima e singela, mas não é um grande destaque visual. Diria, sem desmerecer, não me entenda mal, que é um traço bem comum. Diferente de outros artistas que você bate o olho e fica com vontade ler aquilo imediatmanete, Roca se apega ao básico, investindo nas cores (El Faro é preto e branco), nos personagens e na narrativa, que ele domina muito bem. Em resumo, se você não se depara com um deleite visual, seus desenhos servem perfeitamente à história contada. A montagem dos quadros, a virada de página, tudo isso está a serviço da história.
E é aqui o grande destaque: o roteiro.
Rugas (cuja maravilhosa capa possa me desmentir quanto à arte) é uma pancada seca, sem muitos rodeios, que nos atinge diretamente numa das camadas mais invisíveis da sociedade: o idoso. No caso, o idoso como problema. Fato: nossa expectativa de vida aumentou e não estamos prontos, enquanto sociedade, para tratar com pessoas de mais de 80 anos. E eles são muitos. O dilema do asilo, o abandono, os maus tratos: Paco Roca evoca essas questões com sensibilidade, sem soar panfletário, mas com altas doses de honestidade. É algo tão próximo que parece ter sido contada por um amigo ou primo.Em A Casa o idoso também está presente, mas de outra forma. A casa do título é o mote e principal combusítvel do gibi, que conta a história de três irmãos bem diferentes e a casa onde passaram sua infância. A presença e ausência do pai nesse ambiente vai crescendo conforme a história anda.
As primeiras páginas do gibi (imagem acima), sem diálogos e absurdamente simples, já demonstra aonde o autor nos levará. Uma mensagem poderosa. E novamente, Roca não é melodramático, chato, gratuitamente emocional, panfletário ou excessivo: a história com suas mais de 100 páginas não poderia ser contada com menos (talvez com mais, de tão boa que é). O roteiro de Roca é transparente e sincero. Como dito acima, parece que você está ouvindo um amigo próximo, seu pai, sua avó, te contando uma história que lhe é familiar. A Casa é belo, simples e me cativou pela proximidade com minha própria vida. Me peguei pensando em várias e várias passagens como se fossem minhas, encontrando semelhanças com minhas próprias lembranças. Se uma história não for boa por fazer isso com o leitor, eu não sei mais o que é uma história boa.
Roteiro: Paco Roca
Arte: Paco Roca
Editor:
Capa: Paco Roca
Publicação original: La Casa (2016)
No Brasil: março de 2021
Nota dos editores: 5.0